Afiliação acadêmica - notas ao uso do conceito no Brasil
- Oliveira, Rosângela de Amorim T. de (IFC/FURB); Meneghel, Stela Maria (FURB)
A obra ‘A condição de estudante’, publicada por Alain Coulon em 1977 (publicada em português em 2008), utilizou etnometodologia para analisar estudantes franceses, em seu ingresso na universidade, enquanto aprendiam o que o autor denominou “ofício de estudante” – atividade a ser exercida ao longo de toda a trajetória acadêmica. Este processo de aprendizagem, ou de “afiliação acadêmica”, ocorre em diversas etapas – estranhamento, aprendizagem, afiliação - e demanda do estudante adaptações nos planos: 1. institucional, de normas e códigos próprios da instituição e de seus docentes; e 2. intelectual: vinculado ao letramento acadêmico, necessidade de suprir déficits de aprendizagem, dentre outros. As contribuições de Coulon, decorrentes de estudos cujo lócus de pesquisa foram universidades públicas francesas, têm sido muito difundidas no Brasil diante da demanda por inclusão de novos sujeitos na educação superior – fenômeno que atinge vários países latino-americanos que, nas últimas duas décadas, expandiram significativamente seus sistemas de educação superior. No entanto, as distintas realidades de França e Brasil no que compete a este campo, obrigam observar alguns outros elementos. Neste artigo, analisamos o conceito de afiliação acadêmica considerando-o diante das características das políticas educacionais, do contexto acadêmico e da diversidade do perfil socioeconômico dos estudantes brasileiros. Ele objetiva, para além de identificar aproximações entre os países, identificar peculiaridades. A metodologia deste estudo, de abordagem qualitativa, foi análise de conteúdo da obra indicada. Os resultados apontaram aspectos comuns aos países: quanto ao perfil, a importância da condição de estudantes-trabalhadores, com pouco tempo de dedicação aos estudos e, portanto, mais propensos ao abandono; quanto às políticas, a quase ausência de um olhar das instituições para os distintos ‘tempos’ e ‘planos’ de afiliação dos sujeitos de diversidades. Dentre as singularidades brasileiras, destacamos no âmbito do contexto que a maioria das instituições é privado-mercantil e, portanto, cobra mensalidades. O sistema de ingresso não enfatiza a questão meritocrática, como a França; e, além disso, o Estado dispõe de políticas de ação afirmativa, que conferem acesso a estudantes de grupos vulnerados, principalmente a população baixa-renda. Finalmente, a diversidade étnica e cultural, não mencionada por Coulon, é bastante presente e importante nas políticas educacionais do país em nível macro, sendo extensivas às políticas institucionais. O exposto denota a relevância de utilizar e incorporar o conceito de afiliação para promover inclusão de diversidades na educação superior, sem perder de vista a necessidade de ampliar a perspectiva intercultural.